Eu vi Mamãe Oxum na Cachoeira

Eu vi Mamãe Oxum na Cachoeira

 “Eu vi Mamãe Oxum na Cachoeira”: Uma possível interpretação

 O Umbandokê dessa edição traz a interpretação da canção “Eu vi Mamãe Oxum na cachoeira”. 

Esse ponto apresenta várias versões, sendo uma das mais conhecidas entoada pelas vozes de Desirée, Mônica e Soraya Oliveira, com a percussão de Ernani Fornari. (Álbum: Para os Anjos e os Orixás, de 2015). A cantora Juliana D. Passos, em seu álbum “Atabaque e Voz”, também gravou o famoso ponto de Oxum.

 O ponto chama atenção por não apresentar de fato uma saudação à Orixá, “começando”, sem muitos rodeios, como se “dispensasse apresentações”. No início, as vozes cantam:

  “Eu vi mamãe Oxum na cachoeira /

Sentada na beira do rio” (2 X)

 Aqui o eu lírico (o sujeito que fala), revela ter visto a Orixá Oxum, adotando a expressão “mamãe” para chamá-la, maneira mais lúdica e afetuosa para se dirigir à mãe.

Na Umbanda Sagrada, Oxum é associada à leveza, generosidade e beleza, nada mais justo evocá-la desse modo! Inclusive, o fato de chamar “Mamãe Oxum”, por si só, é uma forma de saudação, tão intimista quanto “Ora, Yê Yê Ô”*!

Vemos também nessa estrofe a presença da natureza (rio e cachoeira), já que Oxum é dita a “Senhora dos Rios e Cachoeiras”. As águas simbolizam as emoções, e assim como as cachoeiras e rios, elas não são paradas, mas seguem o seu fluxo, tranquilamente (ou nem sempre tão tranquilas). Oxum nos ensina a deixar a emoção fluir para nos lavar, nos limpar de dores passadas, nos purificando e renovando, como suas águas. Ela desagrega as energias negativas acumuladas em nosso espírito, para nos curar e regenerar.

 Avançando para a próxima estrofe, temos:

 “Colhendo lírio / lírio ê

Colhendo lírio / lírio á

Colhendo lírio /

Pra enfeitar nosso congá”

Essa “Mamãe, Benevolente” colhe lírios com um propósito claro: para enfeitar o nosso congá. Congá, palavra de origem africana que nada tem a ver com a dança típica cubana ou com a famosa música da Gretchen (risos)!

Congá ou Gongá significa altar ou ainda, local no terreiro, onde se coloca elementos, imagens e símbolos de santos, entidades, no nosso caso da Umbanda Sagrada, estão nossos amados Orixás. Vale ressaltar que o altar tem alto poder de canalização irradiando e transferindo as energias dali para todo o terreiro.

Logo, Oxum prepara o altar para os trabalhos espirituais que ali ocorrerão, de maneira branda e suave, como um ritual.

O lírio é uma flor originária da Europa e Ásia, que avançou por outros continentes, por se adaptar em diversas condições climáticas e tipos de solo. Ele é relacionado simbolicamente, à pureza, inocência e virtude. Na Bíblia, o lírio aparece em algumas passagens e no séc. XVII, foi objeto de decoração em igrejas, representando a virgindade, pureza e santidade.

Na Umbanda Sagrada, além de ser associado à Oxum, por retratar a beleza e a pureza, é também relacionado à divindade Oxalá, criador do mundo e da espécie humana.

Um fato curioso é que essa flor tem uma substância chamada feniletilamina, responsável pelo seu agradável perfume e frequentemente associado à tranquilidade e bem estar.

Um fato relevante também nesse ponto, é o toque adotado pelo atabaque: lento e fluído, como as águas de um rio. Na Umbanda Sagrada, a curimba tem um papel essencial para os rituais e incorporações. As batidas trazem força e energia ao ponto e, mais do que isso, reverberam as energias para todo o terreiro. Com essas poderosas vibrações, nos conectamos com as vibrações espirituais das linhas trabalhadas.

Assim, no caso de Oxum, Iemanjá e outras linhas como os Pretos Velhos, é adotado o toque Ijexá. Ele é conhecido como “apaziguador”, por ser mais brando e sereno, bem diferente quando comparado com os pontos de Ogum e Exu, por exemplo. Mas esse é um papo para as próximas edições….

  *Saudação à Orixá Oxum, em iorubá, que significa, “Salve a benevolente Mãezinha” ou ainda, “Olha por nós, Mãezinha”.

Angelina Nunes 🙂