Uma aula especial de Pretos Velhos

Uma aula especial de Pretos Velhos

Sempre que o Pai Paulo pedia a alguns voluntários para alguma atividade durante a aula, eu ficava com medo. “Não quero/não consigo” era o que passava na minha cabeça. Esse dia foi diferente. Ele mal contou do exercício, eu já estava lá do lado dele como uma das primeiras voluntárias. “O mais novo do TSA que incorpora”, pediu ele. “e o mais velho”. Fui lá, como a “mais nova”.

Entrei em pânico quando ouvi que seria a PRIMEIRA a incorporar e a deixar a primeira mensagem com a minha vovó. Minha cabeça começa a desesperar: “Ela nunca falou, o que eu fiz? Eu nem incorporo direito… meu Deus, por que eu aceitei?”

Somos distribuídos em círculos, e começamos o exercício. Pego uma pedra na mão. Respiro… tento me conectar. Me curvo, a mão começa a tremer. Não solto a pedra, faço vários movimentos com ela. Penso “Tá demorando demais… tudo bem não falar, precisamos entregar a pedra.” E levo a pedra para a orelha e a seguro como se dissesse “é no meu tempo, não no seu. Acalma!”.

Vovó vem e faz vários movimentos. Benze, estala os dedos. E chama a cambone. A pergunta era sobre o ego no terreiro e como lidar com ele. Vovó: “Você não pode plantar o ego. Você tem que plantar o que você quer colher pra sua vida. Se você plantar o ego, você vai colher o ego. Se você plantar o amor, você vai colher o amor.” E entrega a pedra.

Nesse momento eu fiquei um pouco em transe com ela. Eu querendo chorar porque ela tinha falado, ela de orgulho de mim. Conversei com ela, mesmo duvidando um pouco do que estava acontecendo. De repente, meu movimento começa a ficar mais rápido, mais cadenciado, e eu penso: “Eita. Estou me empolgando com o batuque e perdendo a conexão com a vovó… foco, Kelly!”.

E a vontade de continuar nesse balanço para lá e para cá era enorme. De repente, ouço: “Solta a corda. Deixa o barco ir. Aproveita. SOLTA A CORDA!”. 

Por um segundo achei que era o pai Paulo, mesmo não parecendo a voz dele. Foi quando escutei ao longe, aí sim, a voz do pai Paulo pedindo para os pretos velhos partirem. Minha mente: “Como assim! Não era o pai Paulo? Quem é? Que voz é essa? Assustei. E a voz foi sumindo… falando “Aproveita… solta a corda. Acredite em você…”. E volta minha vovó. E me limpa, e vai embora. 

Quando desincorporo eu começo a chorar muito, emocionada e ao mesmo tempo confusa com o que aconteceu. A mensagem que a vovó Maria Conga deu era muito linda. Mas quem era esse homem que me deixou aquela mensagem, pedindo pra eu confiar mais em mim? Ainda não sei… mas foi necessária a mensagem. E depois que soltei a corda, minha mediunidade e minha vida passaram a fazer mais sentido. Adorei as almas vovó! E talvez também, vovô! 

Autora: Kelly Guidotti.

Relatos TSA é o autor coletivo do nosso jornal, dedicado a compartilhar histórias vividas ou contadas em nosso espaço sagrado. Seja para narrar momentos de fé, aprendizados espirituais ou manifestações marcantes, este autor simboliza as vozes que ecoam no terreiro, conectando cada relato à essência da espiritualidade e da tradição.