O Guardião dos Caminhos: a história do Senhor Guardião Tranca-Ruas

O Guardião dos Caminhos: a história do Senhor Guardião Tranca-Ruas

Autor: Rubens Saraceni, 11 edição, 2024.

“Quedas são relativas, Mehi Mahar. Quando pensamos estar caindo, na verdade, estamos retornando e, quando pensamos estar subindo, apenas estamos fugindo de nosso passado e de nossos aliados.”
(Pág. 171)

O livro “O Guardião dos Caminhos” se divide em duas partes: a primeira é a biografia do Tranca-Ruas (Mehi Laresh Mahar); e a segunda é Mehi como relator, narrada em primeira pessoa.

Todo o enredo começa, na primeira parte, quando Mehi é julgado e se torna um caído por amar uma mulher de outra raça, apesar de nunca ter aceitado ser um caído diante do Sagrado Senhor da Luz.

– Os sentimentos não têm cor, Mehi Labor. Eu sou branco e ela vermelha, mas nosso amor transcende essas coisas humanas, pois é um sentimento!
– Leis são leis, Mehi Laresh! Só nos resta respeitá-las e velar para que todos as obedeçam, até mesmo nós. […]
– Não vejo desonra nenhuma em me casar com a mulher que amo, Mehi Labor. Isso é tolice e racismo. Essas leis impedem as pessoas de serem felizes e isso explica parte da descida à carne do Regente planetário do estágio humano da evolução.”
(pág. 29)

Após ser enviado para uma ilha sem possibilidade de fuga em seu exílio, Mehi perde seu grau, sendo reduzido a um pária pelos homens.

“[…] Onde temos errado para que um sistema tão perfeito entre em derrocada? Aferram-se às leis ancestrais e se esquecem do elemento humano, ao qual deveriam se beneficiar.” (pág. 30)

Após sete meses, outro pária chega à ilha: a neta de Mehi Labor, Shell-çá. Ela, punida por ousar ter relações sexuais antes da idade permitida, é enviada à ilha grávida. Sete anos após sua chegada, Shell-çá e Mehi Laresh já estavam casados e tinham sete filhos.

Passados sete anos, Iafershi yê, um enviado da Divindade que rege Laresh como Mehi, vem resgatar Laresh, esposa e filhos, a sair da ilha. Isso se deveu ao fato de Laresh ser portador de um poder negativo, altamente cobiçado pelos magos caídos. Segundo Iafershi, após a queda de Mehi Labor, um novo mundo de ilusões está sendo construído, e a posse do domínio de Mehi poderia resultar em consequências catastróficas. Para evitar tal desfecho, Mehi deve assumir conscientemente seu grau, procedendo como lhe fora ordenado.

“- Por que demoraste tanto em vir até mim, Selmi Laresh? – foi a resposta que obteve à saudação à Divindade natural.
– Desde que me julgaram um caído, tenho fugido de meus deveres, Sagrado Sehi yê. Imploro tua compreensão e teu perdão a este relapso servo da Lei e da Vida.
– Nunca mais confundas tuas dificuldades humanas com teus deveres ancestrais, Mehi Ag-iim-ior-hesh-yê!
– Estou aqui para religar-me com o meu passado ancestral e servir-te, Senhor meu.”
(pág. 61)

Passado o tempo, durante uma noite Mehi e sua família foram acordados de noite por homens brutais e fortemente armados. Eram 20 homens que, “após subjulgarem Mehi Laresh e seu único filho, violentaram sua esposa e cinco de suas filhas, só poupando as duas menorzinhas, com menos de 7 anos de idade” (pág.75).

“Shell-çá, Si-há-n’iim-yê, meu filho, minhas amadas filhas e eu perdemos nosso paraíso, nossa inocência e nossa alegria de viver naquela noite. Por isso, divido minha vida em duas fases: a primeira durou até aquela noite, pois ainda acreditava que o mundo não fosse tão cruel como lafershi o descreveu para mim em nosso último encontro, nas ruínas do Grande Templo. A segunda começou ali, quando descobri que certos tipos humanos tornam o mundo um lugar difícil de se viver. Não imaginas o quanto sofri a partir daquela noite, Niyê he, meu irmão!”
(pág. 76)


Sendo levados para o grande Mago do Templo da Morte como escravos, Laresh e sua família começam uma trama inimaginável, que afetará a vida de todos para sempre.


A segunda parte – narrada na primeira pessoa pelo próprio Mehi Labor como relator, nos oferece uma visão espiritual da bibliografia, revelando um pouco sobre as religiões e os mistérios da religiosidade humana.

Aqui, não cabe a mim trazer os principais pontos desta segunda parte de forma resumida, mas sim o de incitar pequenas reflexões a partir de algumas das passagens presentes no livro.

“O inferno é suficientemente grande para acolher em seus intoleráveis e sombrios domínios todos os religiosos sombrios e intolerantes. Eu disse todos, Niyê he! Por isso, restringe tua indignação aos vermes atuais que tentam corroer a saudável e vigorosa Umbanda dos orixás. Os mesmos vermes que hoje estão de pé, ontem rastejavam nos pântanos do inferno, e para lá hão de retornar. Eles crescem recorrendo a mentiras assacadas contra a Umbanda e o Catolicismo e acumulam uma fortuna pessoal à custa da exploração financeira de seus seguidores e do mercantilismo da Fé. Mas nessa safadeza não estão sozinhos, pois mesmo na Umbanda, tão jovem e tão bela, já pululam os mercadores da miséria humana!”
(pág. 184)

“A concepção de um Deus único para toda a humanidade é muito recente, embora não esteja totalmente fundamentada, pois ainda existem o ódio recíproco entre as correntes religiosas e as guerras “santas” que estouram em todos os cantos do planeta. Realmente, ainda é muito recente a concepção de um Deus comum a todas as espécies, incluindo a humana. Mas o fato é que no Continente Africano não existiam as Sete Linhas de Umbanda. Havia Divindades locais, que atendiam às necessidades religiosas específicas de cada um dos povos que ali cresciam continuamente, e o mesmo ocorrendo no resto do mundo. E isso há milênios. […] É comum a toda a humanidade cultuar só Divindades locais, enquanto não crescem em demasia os focos populacionais, Mas assim que começam as expansões, novas Divindades mais abrangentes têm de ser concebidas para sustentar tal processo.”
(pág. 187)

“Então, pergunto: qual a diferença que existe entre o Papa, que queima uma vela ao santo de sua devoção, e o babalaô africano, que faz uma oferenda ao seu Orixá preferido? Resposta: nenhuma.”
(pág.188)

Por último, deixo uma mensagem do próprio Mehi acerca da nossa vida e prática dentro da Umbanda, que é a busca pelo eterno conhecimento. Que nossa vontade pelo aprender nunca seja saciado, pois uma pessoa que manipula algo que não conhece pode estar entrando em uma grande armadilha futura:

“Um bom médium não se forma com a ausência de conhecimentos básicos e fundamentais. E só a boa vontade dos iniciadores não é o bastante para quem irá manipular poderes que nem sequer conhece.”
(pág. 102)


Legendas:

Iafershi: cavaleiro fiel à Mehi Laresh.

Mago caído: ser humano portador de forte magnetismo que optou pelos processos mágicos negativos. 

Mehi: Mehi, na língua ancestral comum a todas as línguas humanas, significa Guardião natural dos Mistérios da Natureza.

Mehi Mahar Selmi Laresh: Senhor Exu Tranca Ruas. 

Mehi Agiim-sehi lach-me yê: Senhor Ogum das Sete Lanças.

Selmi Laribor: mestre de Selmi Laresh, que posteriormente se tornou um mago ‘caído’. Avô de Shell-ça.

Shell-ça: esposa de Mehi Laresh e neta de Laribor, considerada caída por ter feito sexo antes da idade permitida pela lei.

UX Researcher, professora, apaixonada por ler e ensinar! Quando não está trabalhando, se dedica aos seus dogs, muay thai, boxe e livros. Aluna de desenvolvimento mediúnico de quinta-feira.