
Os pontos de Ogum
Quando pensamos em pontos cantados de Ogum, isso é, as músicas usadas para saudar Ogum, e trazer sua força para nossas vidas, temos verdadeiras obras-primas no campo musical. Isso porque, o orixá é um dos mais populares, no Brasil, e no Rio de Janeiro, onde as raízes da umbanda moderna remontam.
Um desses músicos foi J.B. de Carvalho, morto em 1979, mas cantando desde os anos 30. Suas músicas, cuja autoria não foi possível identificar com certeza (pois Carvalho vem do contexto de comunidades de terreiro), ainda hoje são populares em casas de axé em todo o Brasil.
Sua popularidade pode ser explicada por alguns fatores, tais como a simplicidade das letras, a instrumentalização muito bem arranjada, ou sua incrível capacidade vocal. e mesmo simples, trazem fatores de Ogum que são importantes e se tornam evocações poderosas, no contexto religioso.
Vejamo-las.
Ogum Yara
Ogum Megê, Ogum Megê,
Ogum Yara
Ogum Megê, Ogum Yara
Saravá cavaleiros de Umbanda
Saravá cavaleiros de Umbanda
A noite é linda, é de luar
Ogum Megê, Ogum Megê,
É quem vai rondar
A noite é linda, é de luar
Ogum Megê, Ogum Megê,
É quem vai rondar
Nesse primeiro ponto, começamos com a evocação a Ogum Megê e a evocação e saudação a Ogum Yara:
Ogum Megê, Ogum Megê,
Ogum Yara
Ogum Megê, Ogum Yara
Saravá cavaleiros de Umbanda
Saravá cavaleiros de Umbanda
E por que a saudação é justo a Ogum Megê e a Ogum Yara? Porque as denominações de Ogum, “Megê” e “Yara” são justamente os Oguns que atuam no trono da geração: o primeiro sob as forças de Omulu; e o segundo, sob as forças de Iemanjá.
Assim, o ponto começa evocando os fatores de ordenação e organização de ciclos. Ogum, que trabalha com Omulu, trabalha para encerrar ciclos, e mais do que isso, encerrar ligações, períodos e vínculos que estejam contrariando as Leis Maiores.
Já Ogum Yara é aquele que trabalha na organização e manutenção dos fatores de geração, de mãe Iemanjá. Isto é, ele surge para garantir que todos os trabalhos e atos a serem realizados na força de mãe Iemanjá sejam pautados pela Lei Maior.
E claro que você pode pensar: Iemanjá, Omulu e seus falangeiros não têm força para atuar? Ao contrário, eles têm, e muita, mas quando colocamos as forças de Ogum junto às deles, o que estamos fazendo é trazer segurança espiritual.
Estamos garantindo que os obsessores que por ventura surjam disfarçados de falangeiros de Omulu e Iemanjá não tenham força para atuar, pois ao cantarmos para Ogum Megê e Ogum Yara, estamos evocando e autorizando as forças deles a atuarem sobre todos os seres do local – médiuns, consulentes e espíritos.
Assim, o ponto termina dizendo:
A noite é linda, é de luar
Ogum Megê, Ogum Megê,
É quem vai rondar
Ou seja, aqui temos uma reafirmação das energias e orixás que estarão atuando. Quando o ponto fala em “Noite Linda”, devemos entender a linguagem simbólica: o momento de encerramentos (a gira, a evocação) está em perfeita harmonia, pois o Ogum que atua com as forças de Omulu é quem irá “rondar” (vigiar e garantir a organização viva, divina e espiritual, dentro dos fundamentos da Lei Maior).
Se meu pai é Ogum
Se meu pai é Ogum
Vencedor de demanda
Ele vem de Aruanda
Pra salvar filhos de Umbanda
Ogum, Ogum, Ogum Iara
Salve os campos de batalha
Salve as sereias do mar
Ogum, Ogum, Ogum Iara
Nesse ponto, temos uma letra que é simples, mas também extremamente poderosa, pois ela traz uma condicional que condiciona os espíritos atuantes, de forma que apenas aqueles verdadeiramente alinhados à Lei Maior conseguem trabalhar.
Se meu pai é Ogum
Vencedor de demanda
Ele vem de Aruanda
Pra salvar filhos de Umbanda
O que o ponto nos traz aqui é uma condição: se o espírito for alinhado às forças de Ogum, “vencedor de demandas” (aquele que desfaz trabalhos de magia baixa), ele virá de “Aruanda” (a cidade espiritual onde estão os orixás e entidades alinhadas à Lei): ou seja, ele virá de um campo espiritual elevado, para atuar juntos às entidades e pessoas que o evocaram.
Então o ponto fala:
Ogum, Ogum, Ogum Iara
Salve os campos de batalha
Salve as sereias do mar
Essa evocação à Ogum Iara é, tal como vimos acima, uma evocação às forças criadoras, geradoras e maternas de Iemanjá. O ponto evoca Ogum a atuar sobre os “campos de batalha” (o local onde está sendo realizado o trabalho e a evocação) e atuar sobre as “sereias” que, mais do que representações de Iemanjá, são seres elementais (ou seja, que estão no plano da vida anterior ao nosso, logo, trazem uma pureza e elevação maior) que trabalham com energias aquáticas.
E água, podemos dizer, é o elemento de maior poder dentro da umbanda, pois ela está no início e fim da vida. É pelas águas de Iemanjá que nascemos, e é para as águas de Omulu (o fundo do mar, onde está a kalunga grande) que iremos.
As águas fertilizam o solo – e as ideias. As águas trazem limpeza (física e espiritual). As águas desmancham trabalhos feitos com fogo, sangue, e demais elementos, seja, diluindo eles, seja espalhando a montagem. As águas nutrem o corpo. É pela água que os rins desintoxicam o organismo. As águas são usadas na cicatrização do corpo. As águas eram usadas para encher fossos de castelos (proteção) e proteção do nosso corpo físico e espiritual, por meio de um “fosso” energético. É pelos banhos que recebemos energias vegetais com mais intensidade.
Assim, o ponto faz essa evocação final, para reafirmar a que estamos trazendo a energia de Ogum que atua junto à Iemanjá, a fim de garantir um trabalho espiritual totalmente orientado pela Lei Maior.
Ilustração: Mayara Assis
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