Umbandokê – Ponto de Exu Caveira

Umbandokê – Ponto de Exu Caveira

Existem muitos pontos de Exu cantados na Umbanda Sagrada. E eles são de extrema importância dentro de nossa religião. Lembramos que o ponto cantado é uma oração. 

Além disso, recebi como ensinamento de meu senhor Pai Benedito que o som tem o poder de cura, porque ele movimenta energias.

No campo da Física, o som é energia e aqui não estamos nem falando de espiritualidade, mas de multiplicação de ondas. Experimente falar a uma chama de vela: ela se movimenta.

Assim, vamos estudar um ponto de Exu, para entendermos alguns de seus fatores. Escolhi especificamente o ponto mais conhecido da linha dos Caveiras, porque aqui há milhares de fatores sobre os Exus e sua energia, tanto no campo elemental, quanto no campo de sua atuação espiritual:

Ê, Caveira, firma o teu ponto

Na folha da bananeira

Exu Caveira!

Quando o galo canta é madrugada

Foi Exu na encruzilhada, batizado com dendê

Rezo uma oração de traz pra frente

Queimo fogo e a chama ardente aquece Exu, Ô Laroiê!

Eu ouço a gargalhada do Diabo

É Caveira, o enviado do Príncipe Lúcifer

É ele quem comanda o cemitério

Catacumba tem mistério e seu feitiço tem axé

Ê, Caveira!

Ê, Caveira, firma o teu ponto

Na folha da bananeira

Exu Caveira!

Na Calunga, quando ele aparece

Credo em cruz, eu rezo prece pra Exu

O dono da rua

Sinto a força deste momento

E firmo o meu pensamento

Nos quatro cantos da rua

Eu peço a ele que me proteja

Onde quer que eu esteja

Ao longo desta caminhada

Confio em sua ajuda verdadeira

Ele é Exu Caveira

O Senhor das Encruzilhadas

Ê, Caveira!

Ê, Caveira, firma o teu ponto

Na folha da bananeira

Exu Caveira!

O ponto de Seu Caveira é, definitivamente, impactante. Sem dúvida que traz fatores de enorme poder espiritual. A começar pela folha de bananeira.

Algumas tradições do Candomblé falam que nossa mãe Nanã, quando deixou seu filho Obaluaê (ou Omulu, a depender da tradição) na beira da praia, o enrolou nas folhas de uma bananeira, devido às chagas de seu corpo. A medicina popular, por sua vez, indica, justamente, folhas de bananeira para a melhor cicatrização de queimaduras e feridas.

Ou seja, começamos a análise vendo um fator de Exu: a cura. A cura de feridas, o estancamento de problemas, a paralização de dores – lembrando que “paralisar” também é um fator de Omulu, que é quem? O orixá que rege a linha dos Caveiras!

Mas, afinal, Exu Caveira é um Exu da cura? Com certeza! A caveira é aquilo que temos de mais profundo no nosso corpo físico: o que sobra, depois da morte, são os ossos. Dentro da caveira (isso é, do crânio) temos o cérebro, o lugar de onde saem os pensamentos, o local que nos liga à espiritualidade.

Continuando, vem o intrigante trecho: “Quando o galo canta é madrugada”. Afinal, por que essa insistência em falarmos de galo, quando falamos de Exu? Quem lembra de outro ponto vital, vai entender: “Deu meia-noite / O galo já cantou”.

Galináceos são animais fundamentais na alimentação de povos africanos, então, começa que o galo representa a nutrição, a força, a vida. Além disso, há tradições de Umbanda e Candomblé que entendem uma aproximação dos fatores de Exu (vitalidade, força, proteção, vigília) à forma como o galo “trabalha”, protegendo galinheiros. As garras de um galo, por sua vez, são próximas às “mãos de garra” dos Exus – são mãos que atacam e arranham, ao mesmo tempo em que sustentam e agarram (leitura de um sacerdote de Umbanda Tradicional).

Por fim, há uma lenda da África que fala que Exu-Orixá buscava a criatividade no nosso plano e, indo de casa em casa, via que os animais tinham sempre o mesmo nome. Quando ele chega na casa do galo, fica satisfeito, porque lá cada membro da família tem um nome diferente (galo, galinha, frango, pintinho). E esse é um dos fatores de Exu: transformação e mudança.

E por quê “Madrugada”? Por que se associa Exu à meia-noite? Porque os quatro pontos cardeais do relógio (12/3/6/9) formam momentos em que acontecem grandes movimentações de energia neste plano, para elas serem ou ativadas, ou neutralizadas, ou anuladas? Meia-noite é a hora em que começa um novo dia, ou seja, os trabalhos do dia anterior começam a perder seus efeitos, e um novo padrão de energia começa a se instaurar.

Mais do que isso, é o momento em que o Portal de Luz de Pai Omulu se abre, a fim de que seres desequilibrados possam acessar nosso plano e receber sua cura. Trazer energias novas e encerrar as antigas é um dos trabalhos de Exu. Ainda mais de Exu Caveira!

Seguindo, lemos que “Exu foi batizado com dendê”. O azeite é uma substância pesada. E aqui não apenas em termos de energia, mas quimicamente ele é mais denso do que óleos de oliva ou milho. Na espiritualidade, ele é um óleo de energia de limpeza profunda e é muito usado em trabalhos para Exu devido a essa característica.

E por que a pessoa “reza uma oração de trás para frente”? Por que essa oração “faz queimar um fogo e uma chama”? Porque esses são dois fatores de Exu: o de renovar (pelo fogo) e o de manipular as palavras, a fim de se obter uma graça. Exu não pode ser enganado: ele lê as palavras para além de seus significados e os inverte, a fim de fazer com que a Lei Maior se cumpra, se preciso for. E, na boca de um Exu de Lei, a palavra é fogo, ou seja, é a vitalização e o cumprimento da Lei Maior sobre todas as coisas.

E “laroiê” que vem a seguir? De maneira geral, podemos traduzir “Laroiê Exu” como “Eu saúdo o mensageiro (porque um dos significados de Exu é ‘mensageiro’)”.

Então, aparecem dois nomes contundentes: “diabo” e “lúcifer”. Porém, é preciso que nos lembremos de um fato de Exu que é fundamental: seu campo de atuação em nossos espíritos. Exu trabalha nossos vícios, medos, traumas. O que seria o “diabo” se não aquele lado de nossa personalidade que precisa ser trabalhado e transformado, não é verdade? E Lúcifer? É o mensageiro da luz – ou ainda, da elucidação [sobre nós, sobre Deus, sobre a vida], aquele que trabalha enfrentando, justamente, os excessos de fé, o fanatismo, as ilusões.

Nosso senhor Caveira é enviado pelo mensageiro da luz, a fim de combater esse ser diabólico, e autoritarista, que ri com desdém e desprezo. Quem é esse diabo? Nós mesmos, que precisamos nos curar de todos os desvios que são impostos pela sociedade ou por meio dela.

E assim seu Caveira atua: ele comanda os trabalhos de cura no cemitério. Não apenas o cemitério físico, mas aquele de nossas almas. Aquilo que não encerramos dentro do que é esperado pela Lei Maior, aquilo que está oculto, aquilo que está mal resolvido e que está em aparente letargia, mas que surge com uma força destruidora, justo nos nossos momentos de fraqueza.

Os Exus atuam com suas magias, abrindo as “catacumbas de nossas almas”, a fim de trabalharem a negatividade e os traumas que foram “sepultados” sem o devido cuidado espiritual. “Seus feitiços têm axé”: tem força, renovação, vitalidade, têm cura, às vezes de forma contundente, nunca de forma oposta à Lei de Deus.

Por isso que, quando aparece um Exu na Calunga (isso é, no reino dos desencarnados), a pessoa da música teme: ela sabe que os Exus atuam aplicando a Lei. Ela sabe que aqueles que não trabalham seus “diabos” internos sofrerão por eles, seja nesse plano, seja em outros.

Mas, confiantes no amor de Deus, confiantes no amor e na justiça dos Exus, sentimos a força desse momento (o momento de cura, de renovação, de transformação), pedimos a proteção e orientação deles e seguimos nesse complexo processo, que é o da evolução de nossas almas. Esse processo que é trabalhado por nosso senhor Omulu, executado pelas falanges dos Caveiras. Esses são alguns de seus fatores, mas não apenas deles, e sim de todos os Exus, em algum grau ou escala.

Então, confiem nos nossos senhores Exus. Permitam que eles atuem. Permitam que essa forma de cura e proteção esteja em suas vidas! Permitam-se serem curados!

Laroiê Exu! Salve os Caveiras!

Professor e escritor de São Paulo, sou umbandista desde 2020, Escrevo Literatura, tenho formação em Letras e Oxalá de frente (aluno do desenvolvimento mediúnico de quinta-feira).